Dano moral vs Tempo

Perda de tempo útil pelo consumidor pode gerar dano moral.

Quando o consumidor se depara com problemas causados pelos próprios fornecedores deste mercado de consumo em massa que estamos quase que obrigatoriamente inseridos, demanda-se um desperdício de tempo, em que o consumidor é obrigado a se afastar de seus afazeres cotidianos para buscar a
solução do problema.

O consumidor observa seus direitos serem desrespeitados constantemente por fornecedores que não cumprem com o seu dever de boa-fé, correção e honestidade previstos expressamente no Código de Defesa do Consumidor, gerando a perda de um tempo muito caro àqueles que pouco dele dispõem, devendo haver alguma forma de compensação.

O tempo é hoje um bem jurídico e só o seu titular pode dele dispor. Quem injustificadamente se apropria deste bem causa lesão que ultrapassa o mero aborrecimento cotidiano, sendo, passível, portanto, de indenização valorada economicamente.

Situações que ensejam a perda do tempo livre do consumidor têm sido entendidas como abusivas pelo poder judiciário, sendo passíveis de reparação por dano moral por perda de tempo útil.

A teoria do Desvio Produtivo do Consumidor, criada pelo advogado Marcos Dessaune, defende que todo tempo desperdiçado pelo consumidor para a solução de problemas gerados por maus fornecedores constitui dano indenizável.

O desvio produtivo caracteriza-se quando o consumidor, diante de uma situação de mau atendimento, produtos ou serviços defeituosos ou não prestados/entregues, precisa desperdiçar o seu tempo e desviar seus esforços de uma atividade necessária ou por ele preferida para tentar resolver um problema criado pelo fornecedor. E esse tempo gasto na tentativa de solução para o problema de consumo deve ser indenizado.

A teoria ainda encontra um pouco de resistência na sua adoção pelos Tribunais do país, porém, devido a “recente” decisão que revogou a Súmula que tratava do mero aborrecimento, é possível que a perda de tempo útil seja mais reconhecida nas decisões proferidas pelos juízes, uma vez que a respectiva Súmula era constantemente utilizada para se justificar o indeferimento do pedido de dano moral feito nos processos. Decisão essa acertadíssima, uma vez que as empresas que prestam um mau serviço aos seus consumidores devem ser responsabilizadas pelos seus atos como forma de admoestação:

Súmula do ‘mero aborrecimento’ é revogada
Fonte: redação da Tribuna do Advogado

Foi revogada nesta segunda-feira, dia 17/2018, em sessão realizada pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça, a Súmula 75, que caracterizava o mero aborrecimento. A decisão foi unânime. A ação solicitando a revisão da súmula foi proposta pela Procuradoria da Seccional e a sustentação coube ao presidente da Comissão de Prerrogativas da OAB/RJ, Luciano Bandeira.

“O texto em discussão tornou-se uma jurisprudência defensiva que não atende à sociedade, privilegiando os maus prestadores de serviço. É preciso ter em mente que o mero aborrecimento não resolveu os problemas dos consumidores e que, após 13 anos de vigência, é o momento de discutirmos novamente, em busca do reequilíbrio das relações”, afirmou Luciano aos desembargadores, antes de rechaçar a existência de uma “indústria do dano moral”, um dos argumentos utilizados à época da edição da súmula.
Diante de um plenário lotado por advogados de todo o estado, o presidente da Comissão de Prerrogativas considerou, ainda, que “há um evidente choque entre o enunciado da súmula e o que vem sendo aplicado pelo STJ”, salientando a modificação ocorrida no entendimento do Superior Tribunal de Justiça, que vem consolidando a Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor.

Entendemos que com esta revisão o cidadão vai voltar a ter a possibilidade de reparação, com uma jurisdição voltada, de forma equilibrada, para o consumidor, e não somente para empresas, instituições financeiras e grandes concessionárias. É preciso que essa relação com o consumidor mude, que as penalidades pela má prestação de serviços voltem a ocorrer, até mesmo de forma pedagógica.

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